quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Dos amores platônicos

Ele sorriu. O timing era perfeito. Neste exato momento, ela estaria descendo as escadas do prédio, deveria estar no 3° andar. Ele sabia. Havia a observado durante muito tempo, descobrira seus gostos, seus passos, seus desejos. A conhecia muito bem, aquela vadia prepotente. Sabia quantos minutos ela levava desde a hora de acordar, até o momento de por os pés na rua, com aquele jeito de menina intocável, que só capta olhares vindos de belos rostos angelicais. Ele não era belo, mas isso não dava a ela o direito de rejeitar seu amor, não daquela forma.
Pegou-se pensando em qual seria o nome daquela menina. Não fazia a menor diferença, poderia ser qualquer um, de que isso importava agora? Podia ouvir os passos dela, deveria estar virando à esquerda no corredor do 2° andar. Em poucos segundos ela estaria ali, frente a frente, cara a cara com ele. Suas mãos suavam, não conseguia conter a euforia e o nervosismo que o dominavam. Seu corpo parecia pesado, tinha pequenos espasmos musculares, mas isso, definitivamente, não o atrapalharia. Tirou o punhal do bolso e segurou-o com força, de um modo que não ficasse visível.
Ela surgiu no alto da escada, os cabelos longos presos em uma trança, que deixavam-na com um ar ainda mais infantil. Deveria ter cerca de 14 anos. Tão bonita, tão inocente! Carregava uma pilha de livros e cadernos cor-de-rosa, e parecia não se importar com o que ocorria ao seu redor. Ela notou o rapaz parado perto da porta. Ele era bonito... Os cabelos desgrenhados, a camiseta preta com uma estampa do Kurt Cobain, all star vermelho e a calça rasgada. Já havia o visto muitas vezes nas redondezas, mas ele, provavelmente, nunca a notara. Ela estava no último degrau da escada, quando ele deu um passo a frente. Ela sorriu, ele respondeu-lhe, com um sorriso malicioso.
Não, não seria capaz daquilo. Aquela menina, parecia um anjo. Suas mãos tremeram, segurou o punhal com força, não queria deixá-lo cair. Iria cravá-lo no coração dela, tantas vezes fosse possível, até que não se ouvisse mais sua respiração. Mas ela estava sorrindo para ele. Era um sorriso tão bonito, tão sincero... Não, faltaria-lhe coragem. Ela deu-lhe as costas, seria o momento certo. Ataque-a! Ela virou-se, iria falar algo, mas as palavras não saíam de sua boca, talvez tivesse dito algo, mas fora inaudível. Ficaram olhando-se, sem falar nada. Era como se o mundo tivesse parado de girar. As coisas mudaram de rumo, saíram do eixo, o plano estava arruinado. Era melhor deixá-la ir. Ele abriu a porta, e ela se foi, caminhando alegremente pela rua, como se nada mais importasse.
Que tudo se danasse, ele a amava tanto... Ficou olhando para a lâmina, o punhal refletindo a sua imagem; estava acabado, aquele demônio de tranças havia roubado sua alma.

4 comentários:

Anônimo disse...

Escreves mt bem o texto é nos faz refletir como o amor pode ser intenso,avassalador,mortal e ao mesmo tempo dócil. (Não ligue pra essa amadora aqui)

Beijos continue assim.

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
rickgaldino disse...

É tênue a linha entre o amor e o ódio.

Ela fez mais estrago ao coração dele, do que se ele tivesse cravado a lâmina no dela.

Parabéns pelo ritmo, deixou gostinho de quero mais....